CAPÍTULO NOVE - O VALENTÃO DA CASA AO LADO
A mãe de Christofer pediu-lhe que
levasse o lixo para fora, como fazia quase todas as noites. O garoto obedeceu,
mesmo que contrariado, reclamando da tarefa, como sempre fazia. Era 7:30pm,
momento em que o sol já havia se escondido atrás do horizonte, mas o negrume da
noite ainda não se fazia completo. Fazia frio.
Quando abriu o tonel, à frente de sua
casa, Christofer não pôde conter o berro de espanto. Havia um gato preto morto
ali, numa estranha pose, como se estivesse a ameaçá-lo.
- Não é o seu gato - a voz era de Jerry,
parado a alguns metros, com os punhos cerrados ao lado do corpo, o olhar
impassível - Também não fui eu quem o matou. Encontrei por aí. Tinha acabado de
ser atropelado por uma caminhonete, enquanto brigava com outro gato no meio da
rua. Foi uma cena inspiradora. Ele continuou tentando arranhar seu inimigo,
mesmo enquanto as contorções da morte lhe afetavam.
- Por que colocou ele aqui no meu lixo,
seu desgraçado? Você é louco?! - esbravejou Christofer, largando a carga que
tinha no tonel.
- Louco, eu não sei se sou. Na verdade,
eu nem sei o que sou. Mas eu sinto algo aqui. Algo diferente. E acho que não
devo culpar você por isso, Christofer, mas certamente você teve algo a ver... Que
tal uma metáfora pra explicar, hein? Você sabe o que é metáfora? Então...
Talvez, eu já fosse um montão de palha e lenha, secos e prontos pra queimar,
mas você foi a fagulha que acendeu a fogueira. Que tal?
- Não sei do que você está falando, seu
maluco! Sai daqui, ou eu vou te dar uma surra!
Jerry se aproximou, a passos decididos,
lentos, amplos. Bem devagar. Sem nada falar. Sem mover os braços. Parecia um
robô, ou o monstro de Frankenstein. Christofer recuou alguns passos. Aquilo o
pegou de surpresa. Nunca tinha ameaçado alguém que reagisse daquela forma.
- Sai, cara! Eu vou chamar a minha mãe!
- Isso mesmo! Vamos lá! Peça pra sua
mamãe lutar as suas lutas. Talvez eu possa fazer nela o que pretendo fazer com
você!
- Você não vai falar assim de mim e da
minha mãe! - berrou Christofer, enraivecido, partindo pra cima de Jerry. Mas o
garoto estava prevenido e foi rápido o bastante para arremessar contra seu
rosto um pó que, de imediato, identificou como pimenta, muito, muito ardida,
que entrou em seus olhos, seu nariz, sua boca. Nem conseguiu ver o golpe que
tomou na boca do estômago, com a precisão de um cirurgião. Caiu ao chão, sem
conseguir falar.
Não havia testemunha alguma a passar na
rua, quando uma mordaça foi colocada em sua boca e ele foi arrastado para a
lateral de sua casa, onde os arbustos esculpidos do jardim esconderiam tudo o
que Jerry fizesse, ao menos por um tempo.
A mãe de Christofer, assistindo
televisão em alto volume, porque era surda de um dos ouvidos, não perceberia a
demora do filho em retornar até o fim do segundo bloco de sua novela.
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